Foto: Albenísio Fonseca
Por do sol na Baía de Todos os Santos, reflexo nos janelões do Elevador Lacerda
Albenísio Fonseca
A Baía de Todos os Santos (BTS) está convertida no principal cenário para o desenvolvimento de estudos científicos e de gestão ambiental no Estado. Os projetos visam à revitalização e envolvem o Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Inema) e a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia (Fapesb) – com participações das universidades estaduais, da UFBA, UCSal e Instituto Fio Cruz, entre outras instituições.
Maior do Brasil em extensão territorial, com 1.052 km², e em diversidade cultural, biodiversidade de manguezais, remanescentes da Mata Atlântica, restingas e recifes de corais, além de belíssimas paisagens, a baía tem presente, também, a foz dos rios Paraguaçu, Jaguaripe, Subaé e inúmeros riachos que desembocam em suas águas, no oceano Atlântico.
O amplo território marítimo, subaquático e continental, definido como Área de Proteção Ambiental (APA) através do Decreto Estadual 7595, de 1999 – importando aí toda a fauna, flora e contingente humano – somente em 2009 teve assinado o termo de cooperação para a criação do plano de manejo. Com limites no Porto da Barra, em Salvador, e na Ponta do Garcez, em Jaguaripe, a BTS é área com opções para o lazer, a pesca e esportes náuticos, também como fatores para o turismo em suas 56 ilhas e praias paradisíacas de águas calmas e cristalinas, ainda sob permanente ameaça de substâncias poluentes.
Mas há questões que permanecem sem respostas, antes mesmo de qualquer abordagem sobre a controversa ponte ligando Salvador à ilha de Itaparica, em todo o exasperado processo de expansão urbana e busca de saídas que superem o gargalo da travessia pelo atrofiado sistema ferry-boat, e no afã de canalizar a produção de bens agrícolas originada no nosso novo Oeste. Embora que para a lástima de movimentações por um porto avaliado como o pior do País. Sim, justo este que já foi o “Porto do Brasil”. Cientistas e pesquisadores garantem desconhecer o projeto, em mãos de gestores improvisados e construtoras ávidas por obras faraônicas.
Com contorno litorâneo de 300 quilômetros, e sem deixar de navegar na idéia de que o Estado deve a ela o próprio nome, a Baía é na realidade um golfo composto por três baías, sendo a de Aratu, que comporta o porto do mesmo nome – abrigo da movimentação de 60% de toda a carga baiana em modal marítimo – e a Refinaria Landulfo Alves. A BTS é marcante, ainda, pela retilínea e íngreme escarpa tectônica, onde está assentada Salvador: “Mais belo exemplo de um bordo cristalino de fossa costeira existente em toda a América do Sul”, e que converte a cidade em verdadeiro belvedere.
Afinal, onde andam os programas para a revitalização do tráfego de mercadorias pela BTS? Em qual gaveta ancora a Via Náutica? Saúde-se, agora, o programa de revitalização do Comércio de Salvador, com a demolição dos obsoletos armazéns para descortinar a baía para o povo e o desencalhe de programas para o desenvolvimento de modernas tecnologias de construção naval com a construção do Estaleiro Enseada do Paraguaçu, um investimento privado de cerca de R$ 2,6 bilhões.
Mas, o que atrofia a implantação, na Avenida da França, de um espaço que poderia conter o Memorial do Recôncavo com centros de exposição e conferências, biblioteca, anfiteatro, Museu do Saveiro e tudo o que proporcione às novas gerações vivenciar a memória cultural desta região? Onde estariam assoreados os planos de desenvolvimento para revigorar os estuários do Jaguaripe, Paraguaçu e Subaé? E os programas de assentamento das imensas marginais ao longo desses rios para produzirem bens agrícolas em cooperativas com alta tecnologia produtiva? Cadê a maricultura sustentável e cooperativada, que distribuiria riquezas para as vilas de pescadores? Sim, e o inquérito sobre contaminação do pescado e em crianças da Ilha de Maré por chumbo e cádmio?
Velejemos, ainda, no cenário marcado por forte desigualdade social, com cerca de três milhões de habitantes e mais de 200 empresas e indústrias ou na maré dos seus principais conflitos ambientais, que envolvem pesca com explosivos, lançamentos de efluentes domésticos e industriais, ocupação desordenada do solo, desmatamento, disposição inadequada de resíduos sólidos, caça predatória, extrativismo descontrolado de crustáceos e moluscos, ocupação de áreas de preservação permanente.
Com as fundamentais iniciativas de estudos em caráter multinstitucional e multidisciplinar, malgrado os parcos recursos e desarticulação entre si, falta à BTS um Projeto Metropolitano que considere todos os aspectos científicos, culturais, artísticos e ambientais, na abrangência dos 13 municípios por ela beneficiados, e que reanime a economia regional sem a inconsistência de pontear, unicamente, a vocação em torno da rentável, mas predatória, indústria do turismo.
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Albenísio Fonseca é jornalista